O diagnóstico de doenças genéticas nos embriões antes da implantação no útero, conhecido como PGD ou PGS, e já explicado em vários posts do nosso blog, é atualmente realizado através de biópsia embrionária realizada no 5º dia de cultivo laboratorial, quando o embrião está na fase chamada de blastocisto.
Nesta fase, o embrião já possui dezenas de células (50 a 100, ou mais), e torna-se possível biopsiar algumas células (5 a 10) para a análise genética, com risco mínimo de prejuízo a este embrião, e ainda permitindo maior precisão diagnóstica pelo número maior de células disponíveis para análise.
Mesmo com este avanço da técnica, a biópsia embrionária ainda impõe ao embrião uma manipulação e intervenção que causam preocupação ao embriologista e ao médico. Pois quanto menos tempo o embrião fica fora da incubadora, melhor para o desenvolvimento deste embrião. E para realização do preparo e da biópsia, é necessário retirar mais de uma vez o embrião da incubadora.
Por isso, uma das grandes áreas de pesquisa da medicina reprodutiva hoje é a procura incessante de métodos chamados não invasivos de avaliação do embrião. E um grupo de pesquisadores na Califórnia, Estados Unidos, publicou um trabalho científico muito promissor neste sentido, na revista Fertility Sterility.
Basicamente, o que o estudo buscou, foi a presença de material genético (DNA livre) do embrião no meio de cultura em que ele está sendo cultivado na incubadora. Vamos explicar melhor…
Durante seu desenvolvimento na incubadora, antes da implantação no útero, o embrião fica mergulhado em um líquido especial – o meio de cultivo. Este meio provê ao embrião as substâncias necessárias para seu crescimento e metabolismo em laboratório. O embrião de 3 a 5 dias de vida é biologicamente muito ativo em reações químicas e metabolismo. E ocorrem várias trocas de substâncias entre o embrião e o meio de cultivo.
Entre as substâncias que são excretadas pelo embrião, e vão se misturar ao meio de cultivo estão fragmentos livres de DNA – o material genético do embrião. A ideia é então, por técnicas genéticas avançadas que já são utilizadas, identificar estes fragmentos de DNA, amplificá-los (multiplicar sua quantidade), e assim conseguir um retrato de todo o conjunto cromossômico do embrião (cariótipo) – assim como já se consegue com a biópsia embrionária de blastocisto (PGS) .
Esta técnica fantástica então permitiria traçar a normalidade genética do embrião, ou doenças cromossômicas, analisando o meio de cultivo onde está o embrião, sem precisar biópsia ou qualquer outra intervenção que tenha potencial de prejudicá-lo.
É bom que se diga que esta técnica de análise de DNA livre não é novidade. Já é realizada há muito tempo nos exames do sangue materno para identificação de doenças cromossômicas dos embriões no início da gravidez – o chamado NIPT não-invasivo. Neste exame, fragmentos de DNA do embrião, presentes desde o início da gravidez no sangue materno devido a troca de moléculas através da placenta, são identificados por análise de uma amostra de sangue materno. Através deste exame do DNA fetal livre, é possível analisar vários cromossomos do embrião, como o 13, o 16, o 18, o 21, e ainda o X e o Y.
A novidade do estudo é exatamente tentar utilizar este exame no DNA livre embrionário, presente, como explicado, no meio de cultivo dos embriões.
O estudo foi realizado em 57 embriões que seriam já submetidos à analise genética através de PGS por biópsia embrionária no 5º dia. Nestes embriões, cultivados individualmente, foi feita a pesquisa de DNA embrionário livre no meio de cultivo.
Em 55 embriões foi possível detectar fragmentos de DNA livre. Em 3 deles, a quantidade de DNA permitiu a realização da técnica genética de diagnóstico – o array CGH. O cariótipo dos 3 embriões detectados por esta técnica mostrou resultado exatamente igual ao resultado do PGS realizado nas células biopsiadas do embrião!!
Nos outros embriões, a quantidade de DNA livre não foi suficiente para análise completa do cariótipo por array CGH.
Sem dúvida a seleção embrionária, notadamente do ponto de vista genético, é uma aliado importante na tentativa de melhorar os resultados da fertilização in-vitro (FIV), reduzir risco de gemelaridade, e evitar nascimento de bebês com doenças cromossômicas.
É muito promissor que esta análise genética seja obtida de maneira não-invasiva, sem precisar tirar (biopsiar) células do embrião.
O estudo abre perspectivas fantásticas. Logicamente, a técnica ainda precisa ser bastante refinada, para que possa ter capacidade diagnóstica mesmo com mínimas quantidades de DNA, para que possa ser facilmente realizada em todo embrião cultivado em laboratório. E a ciência caminha para isso !!
Boa leitura e bom proveito! Até nosso próximo post.