A fertilização in-vitro (FIV) é, sem dúvida, o tratamento de reprodução assistida que oferece melhores chances de gravidez para o casal. Quando bem indicada e conduzida, é um recurso fantástico no auxílio aos casais com dificuldades reprodutivas.O sucesso deste tratamento depende de vários fatores, entre os quais podemos citar a idade da mulher, a qualidade dos óvulos, a competência clínica e técnica da equipe médica e embriologistas, e a causa da subfertilidade.
O passo inicial no processo de FIV é a estimulação ovariana (indução de ovulação). É uma etapa crucial, pois dela depende todo o desenrolar do processo. Uma indução bem conduzida vai propiciar uma estimulação eficiente do ovário, aproveitando todo seu potencial de produção de óvulos, e garantir que estes óvulos cresçam e amadureçam de maneira correta, permitindo assim que no dia da coleta sejam obtidos gametas maduros e com excelente potencial de fertilização pelos espermatozoides.
Este processo tem sido exaustivamente pesquisado e estudado ao longo dos anos, desde os primórdios da FIV. Com o melhor entendimento da fisiologia hormonal da mulher e dos fenômenos ovarianos ligados à ovulação, vários avanços têm ocorrido na técnica e nas medicações utilizadas. Hoje em dia estimulamos melhor e mais eficientemente o ovário.
Como é um assunto muito vasto, vamos dividi-lo em dois posts. Hoje vou explicar os conceitos gerais e os objetivos da estimulação ovariana para FIV. Na próxima semana, detalharemos os protocolos e medicações utilizadas no processo.
De uma maneira geral, a indução de ovulação para FIV tem objetivo de recrutar e amadurecer todos os folículos/óvulos que se apresentam naquele ciclo no ovário, com algumas exceções. Vamos explicar melhor…
A cada ciclo, o ovário de cada mulher apresenta uma coorte de folículos que podem amadurecer naquele mês, são os folículos antrais. Este número de folículos apresentados é um reflexo da reserva ovariana da mulher, e pode ser estimado clinicamente por um ultrassom transvaginal realizado no segundo ou terceiro dia do ciclo.
Em um ciclo espontâneo, apenas o folículo mais sensível ao FSH (hormônio folículo estimulante) vai crescer, amadurecer e ovular. Isto ocorre porque após alguns dias de liberação do FSH, a hipófise diminui a produção deste hormônio, e aqueles folículos menos sensíveis vão regredir (atresia folicular). A base fisiológica da estimulação ovariana é propiciar níveis de FSH altos durante vários dias através da administração subcutânea deste hormônio; assim vários, ou todos os folículos vão amadurecer.
Mas será que é realmente necessário amadurecer tantos folículos e produzir tantos óvulos?
Em parte sim. Como não sabemos exatamente a qualidade individual de cada óvulo antes de captá-lo do ovário, e podemos ter óvulos que não vão fertilizar (formar embriões), a tendência é estimular o ovário para obter um grande número de óvulos. Assim teremos garantia de que, mesmo que haja perdas, formaremos um bom número de embriões, permitindo uma seleção antes de transferir ao útero, e ficando com embriões excedentes para congelamento (vitrificação). O objetivo então de produzir muitos óvulos é aumentar as chances de gravidez.
Entretanto, estudos científicos recentes têm demonstrado achados importantes. Primeiro, estímulos muito fortes não são benéficos para os óvulos e nem para as chances de gravidez. Quando o ovário é estimulado excessivamente ocorre grande produção de Estradiol (hormônio produzido pelos folículos ovarianos). Níveis muito altos de estradiol podem alterar o endométrio prejudicando a implantação embrionária. Além disso, níveis altos de estradiol podem ainda levar a alterações genéticas nos óvulos em seu processo de amadurecimento final.
A segunda conclusão dos estudos é que as mulheres que mais engravidaram nos tratamentos de FIV foram aquelas cuja estimulação ovariana produziu em torno de 10 a 15 óvulos maduros. Tanto aquelas pacientes com menos de 10 óvulos (o que pode representar uma menor reserva ovariana), como aquelas com excessiva produção (mais de 15 óvulos) tiveram menor chance de engravidar.
Não devemos esquecer ainda que em pacientes com reserva ovariana alta, e com sensibilidade aumentada às medicações de indução, como as pacientes com ovários micropolicísticos, estimulações fortes podem levar ao desenvolvimento da chamada síndrome do hiperestímulo ovariano. Esta síndrome é uma complicação clínica da estimulação ovariana e causa desconforto e riscos às pacientes, devendo ser evitada ao máximo. Em um post futuro abordaremos esta síndrome.
Portanto, o ideal na estimulação para FIV seria um “meio termo”: estimulação eficiente, mas sem exageros. Assim os óvulos e o endométrio terão melhor qualidade.
Para atingir o objetivo descrito, a medicação básica utilizada é a gonadotrofina. Trata-se de uma medicação estimulante do ovário, com ação semelhante ao FSH produzido na hipófise. Quando os folículos/óvulos atingiram tamanho compatível com a maturidade, outra gonadotrofina é administrada, esta com ação LH (hormônio luteinizante), que vai induzir o amadurecimento final do óvulo e deixá-lo “solto” dentro do líquido folicular, para que possa ser aspirado.
Próxima semana, detalharemos os protocolos e medicações utilizadas na FIV. Vamos falar de Gonal, Puregon, Menopur, Luveris, Lupron, Cetrotide, Orgalutran, Ovidrel, Choragon, etc (ufa!!). Boa semana e até lá.