A Fertilização in-vitro (FIV) é um procedimento de várias etapas, que devem ser cumpridas de maneira otimizada para alcançarmos nosso objetivo – a gravidez. Neste processo, a transferência embrionária, que é a implantação dos embriões no útero, é o passo final e culminante do processo, sendo fundamental para sacramentar o sucesso do tratamento.
Em posts anteriores, detalhamos todos os passos da FIV. Após avaliação do casal através de exames, e definição do melhor protocolo de estimulação ovariana, iniciamos o processo pela indução da ovulação. Após maduros, os óvulos são captados, e fertilizados com os espermatozoides selecionados no laboratório. Este dia é referido no jargão laboratorial como o dia “zero” ou D0, o ponto de partida do processo de formação dos embriões.
No dia seguinte à coleta de óvulos + fertilização, chamado de D1, informamos ao casal quantos embriões se formaram. Esta informação se baseia na visualização, em laboratório sob microscópio, da célula inicial do organismo: o zigoto. Constatamos que o zigoto se formou quando os pró-núcleos derivados do material genético do óvulo e espermatozoide se apresentam na célula, e houve liberação do segundo corpúsculo-polar ovocitário (pois a divisão final do óvulo ocorre imediatamente antes da fertilização).
Este organismo, o zigoto, é a célula inicial do corpo humano. É uma célula toti-potente, pois dela irão se formar todas as células, tecidos, órgãos e sistemas do corpo humano – é o fantástico milagre da vida! O zigoto, logo que formado começa a se dividir em outras células (chamadas blastômeros), em um processo que chamamos de clivagem. Inicialmente se divide em dois blastômeros. Cada dois em mais dois, e assim por diante, em progressão geométrica.
O acompanhamento laboratorial dos embriões ocorre exatamente pela avaliação deste processo de fertilização e posterior clivagem. Desta maneira é que estimamos a viabilidade do embrião, sua qualidade, e potencial de implantação no útero. Em geral, no dia 2 após a fertilização ou D2 o embrião deve ter de 2 a 4 células ou blastômeros. No D3, os embriões de boa qualidade têm em torno de 8 células.
Contam pontos positivos na avaliação do embrião os seguintes fatores: clivagem embrionária no tempo certo (levando a número de células adequado para o dia de desenvolvimento); divisão celular harmônica e equilibrada (levando à simetria dos blastômeros) ; e ausência de fragmentação embrionária (pedacinhos de citoplasma das células que derivam de divisões celulares não –equilibradas).
Após o estágio de 8 a 10 células, atingido por volta do D3, as divisões celulares ficam cada vez mais rápidas, e logo se perdem os limites entre as células. Passamos a ver um aglomerado de células, e dizemos que o embrião está compactando. É um ótimo sinal ! A medida que esta compactação e o número de células aumentam, o embrião atinge o estágio de MÓRULA, normalmente no D4.
No D5 de desenvolvimento embrionário, o embrião atinge a fase de BLASTOCISTO. Neste momento começam a se diferenciar dois grandes grupos de células no embrião: o ectotrofoblasto, e a massa celular interna ; e ainda começa a se formar uma cavidade com líquido chamada cavidade blastocística. O ectotrofoblasto vai originar tecidos placentários, juntamente com a parte materna da placenta.
A massa celular interna do blastocisto vai se diferenciar (especializar) levando à formação de todos os tecidos do embrião. Nesta fase, este conjunto totipotente de células representa a mais rica fonte das chamadas células-tronco embrionárias, que vem sendo intensivamente estudadas e pesquisadas em todo o mundo, como material biológico de alto valor para formação de tecidos nobres, e curas de inúmeras doenças.
Quando a cavidade blastocística está completa, dizemos que o embrião está expandido. Nesta fase, que ocorre no D5 ou no D6, o embrião começa a fazer o processo de ruptura da zona pelúcida – um fenômeno chamado de hatching. A zona pelúcida é uma membrana rígida que protege os estágios iniciais da vida, desde o óvulo, até a fase de blastocisto do embrião. Todas as divisões celulares iniciais, até este momento, ocorrem dentro desta cápsula protetora. Para que se implante no útero, o embrião deve sair deste invólucro, fazendo literalmente um buraco nesta camada e se esgueirando para fora da zona. Assim vai se posicionar sobre o endométrio e iniciar o processo de implantação.
Em condições naturais (gravidez espontânea) o hatching ocorre quando o embrião, após percorrer toda a trompa, chegou ao útero, que corresponde ao quinto ou sexto dia pós-fertilização. No laboratório podemos observar o início deste processo se acompanhamos o embrião até o D5 ou D6, mas devemos imediatamente transferir o embrião ao útero se o hatching espontâneo começa a ser observado. Quando o embrião é transferido no D2 ou D3, muitas vezes se faz o chamado “Assisted hatching”, ou hatching assistido: um pequeno buraco é confeccionado na zona pelúcida com uso de laser, imediatamente antes da transferência.
A transferência embrionária na FIV é realizada, na maioria das vezes no D3, quando o embrião, em condições ideais, está com 8 células. Pode ser realizado no D2 nos casos de pequenos número de embriões, ou nos casos de menor chance de gravidez, como idade materna avançada ou baixa reserva ovariana.
Nos casos em que existe um número grande de embriões de boa qualidade no D3, podemos estender a cultura até a fase de blastocisto. Isto permite uma melhor seleção embrionária para transferência, e ainda a diminuição do número de embriões transferidos mantendo a mesma chance de gravidez, o que permite reduzir taxa de gravidez múltipla. Existem alguns estudos científicos, inclusive, que afirmam ser esta fase (blastocisto) a fase ideal de transferência embrionária, pois é sincrônica com o que ocorre na natureza – embrião na cavidade uterina no D5 ou D6, e proporcionaria maiores chances de gravidez.
Vimos detalhadamente como se forma e desenvolve o embrião na FIV. No próximo post vamos falar de como é feita a transferência embrionária, e da escolha do número de embriões a serem transferidos ao útero. Até lá!